quinta-feira, novembro 15
Boa noite amigos,
Cá estou de novo, voltei com o frio, com o pêlo quase assado junto ao aquecedor, que a madura é gentil e também tem os pés a pecisar de calor.
Já faz algum tempo que não vinha espreitar este canto, espero que as patinhas não tenham ainda perdido o jeito e, quem sabe se a patroa não se agarra de novo ao teclado. Não andam bons, os tempos lá por casa; eu faço o que posso, aconchego-me junto às pernas dela, sigo-lhe os passos de perto, deixo o refeitório arrumado e os lavabos asseados, que não a quero maçar. Bem sei que foi há três anos atrás que me acolheu aqui nesta casa, sem desconfiar que iria ficar sem sofás, cadeirões, e rasgões nas cortinas. Isto sem falar dos pêlos que largo por todo o lado, que raio de pelagem eu havia de arranjar, uma praga na roupa, nos tapetes e naquilo que ela ainda chama de almofadas.
Também tenho aprendido alguma coisa, a curtir a cena das visitas, por exemplo. Dou um ar da minha graça, sou gentil, fofinha, sempre ganho umas carícias e, por, vezes até uma latinha de salmão para desenjoar da ração. A irmã da patroa nunca se esquece, a querida, que o Deus dos humanos guarde a minha benfeitora que em boa hora me salvou da vida de rua. Boa gente esta, que ajuda quem precisa, sem foguetório nem incenso.
Parece-me que é tudo por hoje. Apagam-se as luzes que já são horas de tentar dormir, que venha o sono depressa para lhe chegar a calma do corpo e do espírito. Prometo que lhe deixo cortar-me as unhas.
domingo, abril 15
Esta é my kind of town
Muita coisa: museus, gente, montras, vistas de arranha-céus, parques, o este, o oeste, bibliotecas, uma ilha, ferries, armazéns, espectáculos, áreas reabilitadas, mas principalmente edifícios.
Tenho que começar por algum lado e pode ser por um museu fantástico com as fotografias da Cindy Sherman, um jardim interior e restaurante incríveis, isto sem falar da loja com material para todas as bolsas. Até a Andie MacDowell andava por lá, na maior, entre os restantes mortais.
quarta-feira, abril 4
sábado, março 31
quarta-feira, março 28
From Central Park with love
Assim que me lembro que já falta pouco, prendem-se-me as mãos ao teclado e não sai nada. Mas se tudo correr bem, hei-de sair de um avião perto da cidade que nunca dorme onde, com tanto para ver, também eu terei pouco tempo para dormir.
Fica prometida uma fotografia junto da Boathouse , um olá aos passarocos obesos da Ana Cristina e um raminho de oliveira na Old Cathedral of St. Patrick em Nolita (a catedral onde Michael Corleone foi baptizado quando se tornou Padrinho).
terça-feira, março 27
Em pastel me deito
Uma decoradora falhada, é isso mesmo. Fico sempre surpreendida com a criatividade dos outros e com a forma relativamente simples como organizam espaços, combinando cores com estruturas. No final aquilo fica quase sempre lindo, harmonioso e com sentido. Enfim, cada um é para o que nasce.
"Branco" repondem elas, meninas janotas com gosto e jeito. Têm um blog (Cultodecor) e um sentido de estética que me agrada. Tivesse eu dinheiro e estou certa de que fariam as delícias das minhas paredes.
Como os outros
Vejo-os debruçados nos eléctricos e autocarros, de câmara em riste e guia na mão, calcorreando as ruas e espreitando vielas à descoberta daquele canto, de um qualquer azulejo desconhecido, movidos pela curiosidade ou simplesmente perdidos pela cidade. Sortudos, sobem e descem a calçada com a boa sandália que nós, simples índigenas, entre o emprego e uma fuga rápida, não podemos usar. Revejo-me neles em terras estranhas, curiosos e disponíveis, por entre igrejas, monumentos e garrafas de água, andarilhos de mapas e mochila, uma fotografia aqui, um filme ali, uma sombra ou uma mesa.
Entram nos cafés com discurso arranhado em língua estrangeira e por vezes lamento-lhes a escolha, defraudados por menus plastificados e confecção manhosa. Temos pena, amigos, mas é assim; já passei pelo mesmo.
Descabelados e coradinhos, lá vão espiolhando as indicações do guia, porventura mais conhecedores da história do que os autóctones, mas invejo-lhes a desenvoltura como lêem mapas, numa cidade onde falha a sinalética e a orientação turística.
Revejo-me neles à descoberta de recanto perdido sugerido pela literatura ou por ouvir dizer. Não é certo que nos encante, mas tem que se ver. Ir para contar, isso é bom. Confesso que sou mulher de American Express; coisa geral mas organizada, bairro a bairro, instruções à risca por falta de orientação, que já me conheço. Deixo os pormenores para mais tarde, caso haja a possibilidade de voltar. Deixo os locais escondidos para outros guias com segredos e insólitos, uma curiosidade estudada em textos elaborados, coisas de escritores por terras estranhas em hoteis caros e mesas fora do meu alcance.
Raramente nos confudimos com os residentes; em cada turista há uma atenção redobrada, uma curiosidade que nos distingue, uma palavra que nos revela, um gesto que nos descobre. Somos os outsiders em terras estranhas, bons para a economia, quantas vezes com hábitos estranhos e comportamentos bizarros, de uma excentricidade solta fora de portas, estranhos libertos em terras estranhas, com objectivas à medida dos olhares de cada um.
Revejo-me neles à procura de um banco ou de uma sombra, entre visitas ou sem horários, interessa tudo ou quase tudo seja em destinos exóticos ou por terras cosmopolitas. E não faltam as comparações com as origens, para o bem e para o mal, que a viagem tem regresso marcado para mais tarde recordar.
Nunca se deixa de sentir entusiasmo por novos lugares mesmo que por lá já tenhamos andado. Com sorte, este ano será um bom ano: viajar nem sempre obriga a livros de instruções.
Fora da moda
É informação requentada, bem sei, mas é tanta coisa todos os dias, às vezes pequenos nadas que nos maçam, nos enervam, entristecem mas outros há que nos animam e entusiasmam.
Foram alguns filmes, boa comida e excelente companhia, no meio de uma penúria instalada sem dinheiro para (muitos) palhaços nem para tendas de circo. Desgraçadamente pouco sobra para os figurantes que se desdobram em vendedores de pipoca, malabaristas e ajudantes de ilusionista. Agora já não só os mesmos de sempre, mas também outros, disfarçados de domadores de leões e de trapezistas sem rede
Fartos de tanta fotosíntese, bem que podiam aparecer nuvens carregadas de chuva para limpar o ar e dar vida à terra; São Pedro anda de candeias às avessas com a malta aqui do pedaço e de nada têm servido procissões e rezas em terras de solos secos. Restam as danças da chuva, porventura por encomenda on line para alguma Reserva Cheyenne, ou talvez não, que os americanos, como se pode ler em qualquer manif que se preze, são os culpados disto tudo.
Por cá também foram tempos de moda, mas desta vez não fui agraciada com o dom da credenciação. Valeu-me um convite amigo e uma referência simpática. Obrigada Mónica, uma blogger gentil e competente.
segunda-feira, março 26
O correr do tempo nesta villa operária
Olá a todos,
Aqui estou de novo e, em bom rigor, não estive doente, graças a Deus. Foram as maleitas da idade, novos compromissos, mas principalmente uma enorme preguiça. Uma calaceira confessa ou uma blogger de meia de idade à procura de um novo tom de escrita, com posts pelo joelho e com menos vontade de pechisbeque de cores garridas, seja lá o que isso for.
A verdade é que muita água passou por debaixo destes posts, de janelas abertas a ventos suaves e a enxurradas capazes de destruir eco sistemas frágeis como o ser humano. Mas a tudo se vai sobrevivendo; é deixar a janela entreaberta a ventos mansos e tépidos, que talvez a vida nos possa levar para green pastures and quiet waters.
Hão-de vir mais ventos fortes, marés violentas e mil tormentas, mas também temporadas de bonança e corações que nos apaziguam. Haja saúde, que o importante é voltar.
terça-feira, fevereiro 14
Casa cheia
Pensava eu que uma casa adormecia na nossa ausência. Nada de mais errado; uma casa vazia (ou em silêncio) tem sons que não nos dão sossego, maçam quando precisamos de descanso, acordam-nos quando necessitamos de dormir.
Quando alguma maleita nos derruba e nos deixamos estar quietos à espera que a tranquilidade ajude à cura, enche-se-nos a casa de barulhos, solicitações, exigências e impertinências. Só coisas que chateiam quando o corpo pede tranquilidade e a cabeça descanso.
É o carteiro logo cedo, carta registada a precisar de recepção, um sobresalto antigo que só Deus sabe, coisas que só quem passa por elas é que sabe, uma sirene, sons estridentes, uma chamada fora de horas, não é coisa boa. Uma assinatura na linha por favor e bom dia. Pois bom dia que faz o seu serviço e me me obriga a tanto esforço e susto.
Mais umas testemunhas de uma fé que desconheço e quero ignorar, com promessas de paz no futuro, pois sim, mas tenham um santo dia, fiquem com os vossos folhetos e eu com os meus químicos.
O vendedor de telecomunicações desistiu perante a minha recusa em voz arrastada e ainda me neguei a outra campainha, tudo isto pela manhã.
Entretanto ladram cães, o estudante de canto pratica gargarejos e escalas absurdas, o aluno desocupado arranha a viola com notas semelhantes a grunhidos, as empregadas da limpeza falam nos corredores numa língua distante, pelo telefone oferecem um cartão de crédito e até a gata tirou a manhã para me maçar.
Pode ser que venha o sono e que traga descanso ao descanso. O que queria mesmo era um copo de água.
Em quatro
São mil e um papelinhos, agendas antigas, tempos amáveis, outros nem tanto, coisas más e boas que nos lembram partes de uma vida com momentos alegres, arrependimentos, tristezas e sorrisos. Basicamente tralha inútil que se acomoda anos a fio dentro de gavetas à espera de ocasião para desaparecer. De tempos a tempos, mão diligente e rápida corta-lhes o pio e remete-os para o seu habitat natural, ou seja, o caixote de lixo, abrindo espaço que porventura virá a ser ocupado por mais tralha inútil.
Que intereressa isto e mais isto, gatafunhos que tiveram vida própria em data incerta ou mais que certa, notas a que já perdemos o rasto e outras que queremos esquecer. Em boa verdade espera-se sempre que venham boas novas a ocupar-lhe o espaço, outra mão cheia de literatura cor de rosa de pequenas dimensões, anotações várias consideradas de extrema utilidade, que serão votadas ao esquecimento em tempo próprio.
Mas que ideia aquela de guardar esta conta, este papelinho, esta treta de má memória, que interessa encapsular isto num tempo que não volta mais de bom que foi, ou esquecido à custa de tanta lágrima. O que conta não está aqui. Aqui jazem ideias peregrinas de coleccionar instantes ou informação que teimamos em arquivar. Pronto; este amarelado do tempo ainda cá fica. Até à próxima.
quinta-feira, janeiro 12
Ao lado
Vão sentados no chamado "lugar do morto" ou "pendurados" ao lado do condutor e, ao contrário do que por vezes possa parecer, esse lado não vem equipado com travões nem volante. Sabem certamente a quem me refiro, ás passageiras e passageiros que transportamos na nossa viatura e que, por nervinhos, por vício ou necessidade, nos irritam durante a condução (seja ela cautelosa, ou brusca): não encostes tanto à direita, trava, passa o sinal, olha a curva, não viste o sinal, mais devagar, mais depressa, cuidado com o camião, não ultrapasses, passa agora, olha a berma, isto, aquilo e outro, coisas que enervam quem conduz, que irritam quem vai ao volante e que pressionam quem necessita de estar concentrado. Em suma, viagens maçadoras e perturbadoras também para quem viaja no banco de trás.
Curiosamente, muitos destes "penduras" (que nem um mapa sabem ler), não têm sequer a carta de condução; são uns auto-didactas da estrada, uns opinativos compulsivos, gente que não sabe estar calada e que trava e acelera em pedais invisíveis, ultrapassa e buzina ao lado do condutor, em vez do condutor, com o condutor.
Em boa verdade, tenho tido sorte. À excepção de um ou outro metediç@, não se metem no meu caminho. Um suspiro ou outro de impaciência, vá lá, mas nada mais que isso. Conduzo devagar, devagarinho, mas isso são coisas minhas e pronto e, por inerência, sou uma passageira silenciosa. Quando tenho cagufa de ir com determinadas pessoas, não vou. Clarinho como água. Era o que faltava viajar (ainda mais) com o coração aos saltos.
Já agora, uma observação inteligente: uma coisa são os opinativos-compulsivos, outra bem diferente são as verdadeiras ajudas "à pendura", informações bem dadas e não gritadas, estilo guinchar em cima de um cruzamento "corta à esquerda".
Estacionar o carro, apagar as luzes e desligar o motor; tenho dito.
(Para que serve esta 6ª velocidade?)
Estacionar o carro, apagar as luzes e desligar o motor; tenho dito.
(Para que serve esta 6ª velocidade?)
quarta-feira, janeiro 11
Palavra do ano
Não foi esmiuçar, nem vuvuzela, nem troika, nem sequer austeridade. A palavra do ano neste blog foi até breve.
segunda-feira, janeiro 9
sexta-feira, janeiro 6
quinta-feira, janeiro 5
Um blog a seguir de pertinho. Não são ondas, mas grandes vagas de prosa enxuta e bem pensada.
Seja bem vindo a estas terras cor de caril.
segunda-feira, janeiro 2
A galinhola por dama de companhia
"Gostam de galinholas, estes bacanos? Pois vão vê-las aos quadros da Gulbenkian, com paredes cheias de naturezas mortas!! Comprem vistalegres decorativas, se gostam assim tanto de nós: antes em cima dos móveis do que nos vossos estômagos, desgraçados. Leiam S. Francisco de Assis. Pois não sabem eles que "Todas as coisas da criação são filhos do Pai e irmãos do homem... Deus quer que ajudemos os animais...,Não te envergonhes se, às vezes, os animais estejam mais próximos de ti do que as pessoas. Eles também são teus irmãos".
Desconfio que dos franciscanos só conhecem aquele frade simpático que anda de mercedes e curte touradas. Mas certamente se recordam da nossa irmã Brigitte Bardot. E que disse ela? " Eu dei a minha beleza e a minha juventude aos homens. Agora dou a minha sabedoria e a minha experiência aos animais." Ponhan aqui os olhos nesta frase, que já de nada vale olharem para aquele corpo que em tempos idos foi o mais fantástico de todos os mundos.
O melhor é agachar-me, muda e queda, que os ouço aproximar. Para nos moerem o juízo sabem acordar cedo, estes marmanjos. Para os empregos, ai ai, que sono temos. Desapareçam, que têm as lancheiras com boa comida e melhor bebida. Em casa pode ser que vos cheguem a roupa ao pelo com o rolo da massa, andor, desgraçados.
Estou frita, ou melhor, estou a caminho do forno, com as tripas em paté. Pode ser que os maduros se engasguem com a tosta. Ai.....
(Nota: título a pedido)
domingo, janeiro 1
2012
Já cá estamos; vivos e com 12 desejos, 12 passas empurradas com champanhe de verdade, que se deve começar o ano com qualidade.
Os desejos são sempre os mesmos, mas este ano até com o 1º Ministro em lugar elegível no desejómetro; que Deus o ilumine para orientar este país pobre e madraço, onde a mediocricidade, o esquema e o compadrio medram como ervas daninhas. Que os justos de coração, honestos por natureza e competentes por vocação tenham mérito e sabedoria nos lugares que merecem.
Um desejo também a pensar nos pobres do meu país, nos desempregados desesperados e nos doentes sem esperança.
Um desejo para os meus que me são próximos, por quem eu dava a vida, que este ano lhes seja amável e feliz.
Um desejo absoluto de saúde, o primeiro antes de todos os outros. Um desejo de felicidade, este ano com um rosto meigo e tranquilo como uma planície alentejana, que este ano seja o começo de muitos, assim nós queiramos e as circunstâncias não nos sejam adversas.
Um desejo de felicidade para as minhas queridas amigas e amigos, uma passa cheia de carinho e coração grande.
E o desejo de estar aqui para o ano: o importante é voltar.
sábado, dezembro 31
4, 3, 2, 1...
O ano velho termina com sol mas não com as lides domésticas, a exigir sempre uma permante dedicação, com tudo a regressar aos seus lugares, armários e gavetas. Que isto seja uma questão de princípio mas não um modo de vida. Alguma desordem tem a sua graça, torna o espírito mais livre e vive-se com menos constrangimentos. Coisas minhas.
Que o ano novo que aí vem seja bondoso e suave para todos. Que esta cidade se torne mais amigável e que a luz verde encha Alvalade de alegria.
Fico por aqui, com optimismo moderado, que os tempos não estão para festas.
Escolha, para terminar o ano, a superstição que mais lhe aprouver, porque mal não há-de fazer.
Obrigada pela vossa companhia neste blog um pouco rarefeito e de actualização intermitente.
Que os vossos desejos se cumpram, assim como os meus que também sou filha de Deus.
Encontramo-nos aqui em 2012. O importante é voltar.
Steve Harley & Cockney Rebel- Make Me Smile Live
Para todos os que, durante 2011 me fizeram sorrir.
Para todos os que tornaram a minha vida mais amável.
Obrigada pela vosssa amizade.
sexta-feira, dezembro 30
Finais de festas
Estes dias não tenho ouvido outra coisa senão gente a lamuriar-se de tanto alimento ingerido durante estas festas. Por mim, acho mal e não me queixo. Lamentar-me de uma mesa farta, essa agora?! Pois os sonhos e o bolo-rei têm o mesmo sabor no resto do ano? Julgo até que o presente do marido, dos pais ou dos irmãos, a surpresa do namorado e o artesanato dos filhos adquire um significado diferente, objectos de que se vai falar no resto do ano e pelos quais se tem um carinho e uma lembrança especial. Diga-se para o bem e para o mal: sei de crianças desoladas por receberem uma prenda mais cara do que as dos irmãos, e por isso uma única prenda, motivo de todas as tristezas. Nestas coisas, o número conta, estou farta de o repetir.
Voltando aos estômagos pesados de perú e cabrito, ouvi hoje uma madura numa perfumaria pedir um creme para a cara, dizia ela, desgraçada de tantos fritos. Dir-se-ia que a qualquer momento lhe poderiam saltar azevias das bochechas e erupções de filhós da testa. Enfim. Já lhe tenho ouvido chamar muitos nomes, mas fritos, foi a primeira vez.
Pois eu gosto do Natal, de uma linda mesa cheia de iguarias que não tenho no resto do ano, gosto que me ofereçam uma travessa de trouxas de ovos, frutas cristalizadas frescas e claro, de comer tudo aquilo a que tenho direito. A queixar-me não tenho o direito.
(Texto já editado)
quinta-feira, dezembro 29
Monção das cores
Vejo-as vaguear pelas lojas, nas ruas, meio perdidas nas grandes superfícies, olhos mortiços, olhar alheado e luto indisfarçavel. As ausências são lixadas nesta altura; as mortes recentes reabrem as suas feridas e, mesmo sem querer, afastam os felizes, como uma doença contagiosa.
"É isso", penso eu, "o anonimato pode ser benéfico; para as empregadas do comércio com quem falam são só mais uma cliente, uma anónima sem circunstâncias e por isso são tratadas sem perigo de contágio.
O anonimato serve para o desabafo, para a confidência e para o queixume. A indiferença também pode ser amiga, caso se fuja (nem que seja por momentos) do aconchego e a familiariedade. Compreendo-as. O coração continuará apertado, mas o tempo há-de ajudar. Porventura um dia poderão voltar de novo a sentir-se vivas e a cuidar dos vasos ou dos canteiros; as plantas sem raíz não são boas companheiras. Rapidamente ficam sem cor nem cheiro e definham como naturezas mortas. Ficam bem nos museus emolduradas, mas não nas nossas vidas. Com alguma sorte, mais tarde, a vida pode voltar a escrever-se com outras letras e hão-de vir novas celebrações, assim tenham o coração aberto para as receber,
quarta-feira, dezembro 28
sexta-feira, dezembro 23
quarta-feira, dezembro 21
domingo, dezembro 18
Diário de uma gata enquanto blogger (13)
Eu devia contar o que sei, mas confesso que temo retaliações (a comidinha boa, o quentinho, estão a ver a cena, não?). Quem me conhece sabe que sou uma gata fácil, que aceita subornos em troca de festas no pelo branco. Os maduros tratam-me bem e gosto de fazer amigos; ainda há dias conquistei um simpático que se declarava anti-gateiro primário, e agora já somos compinchas (o meu silêncio é barato e vende-se no supermecado em latinhas gourmet) .
Há uns tempos houve uma cena chata e tive mesmo que desabafar, algo magoada, nas costas do sofá que ainda estava em bom estado. Afinal a culpada fui eu, que acho fixe passear por entre as mil e uma caixinhas existentes em toda a casa no geral e na cómoda em particular. No tempos livres curto fazer gincanas, pé ante pé, toureando a moldura e a jarra, em voos rasantes sobre os guarda-jóias. É certo que as aventuras nem sempre correm bem e de vez em quando, pumba, lá temos alguns sinistros com os destroços espalhados sobre o chão, mas aquilo foi chato; doeu, pronto.
A história conta-se depressa: uma gaveta aberta, um apetite de malhinhas finas e douradas, aqueles fios tão bons de puxar, um brinquedo novo ao alcance das minhas patinhas. A patroa vê aquilo e não gosta do que vê, ou seja, uma gata de pelo branco mergulhada na gaveta e zás, uma caixa de lorenine contra o meu garboso cachaço. Não gostei, pois então, que sou uma bicha sensível. Três dias a fazer beicinho sem a demover, ela zangada comigo, eu a transferir a minha mágoa para as cadeiras da sala, mas já nos entendemos. A má notícia é que os lorenines ainda lá estão; a boa notícia é que não precisa deles.
terça-feira, dezembro 13
Se eu soubesse, escrevia assim
"Não têm coxas, nem rabo, nem carne nas pernas. As mamas apresentam-se como próteses mal coladas sobre uma parede de ossos. E o rabo, enfim, que rabo, alguém o viu? (...) Estão-me a dizer o quê precisamente com este anúncio, estimados senhores da Triumph: que umas gajas encanzeladas a fazer beicinho com o cu empinado e besuntadas em óleo fula são o novo paradigma de sensualidade? Ou que as suas clientes ideais deveriam ter este aspecto tremebundo? A quem vai dirigida esta campanha realmente? Às mulheres que nunca terão a barriga metida para dentro nem excesso de ossos? Ou aos homens? Nem sequer é para todos os homens, claro.
Os senhores da Triumph, ao escolher estas desgraçadas, não pensaram no povão, não. Pobre gosta de gorda. Já os homens sofisticados, esses gajinhos que não param de falar dos relojinhos e as sapatilhinhas e as calcinhas de marca, esses idiotas deslumbrados com as modas lisboas e os bares que são clubes no Cais do Sodré e restaurantes japoneses, esses sofisticados idiotas é que sabem de beleza. Para estes imbecis gaja boa é gaja magra e as mulheres querem-se biafrinhas, de ar enjoadinho, transparentes.(...)
A ideia que um homem me ache obesa em comparação com uma carcaça com sutiã que não pesa mais de quarenta e cinco quilos é assustadora. E triste. E cada vez que leio ou ouço um gajo a chamar gorda a uma miúda normal só me apetece mandar-lhe para a puta que o pariu."
Gosto sempre
o que escreve o Luis Miguel:"Até ao ano passado comprava lampreias de ovos na Pastelaria Suíça antes do Natal. A última vinha mergulhada na calda de açúcar que agora se usa para aumentar o peso (e o preço) das encomendas. Nunca mais lá pus os pés.
A pouco e pouco a decadência das casas de comércio tradicionais alcança também o bolo-rei. Na Confeitaria Nacional, a mais insigne entre quem não frequenta a Versailles ou a Garrett, provei hoje uma fatia que me pareceu adequada ao gosto dos novos tempos: quase nenhum sinal de frutas, massa pouco húmida, um resto de aroma a porto que talvez custe o emprego ao pasteleiro e em breve desaparecerá. (...)
Com o passar dos anos tornamo-nos conservadores, não por razões filosóficas mas porque o progresso nos dói e já não nos traz boas notícias. Eu só queria a minha fruta, a minha prenda e a minha lampreia tal como eram quando eu era criança e o tempo ainda não existia. Mas sei que é pedir muito."
O concurso do presépio
Há anos que andamos por aqui, eu e o Luis Novaes Tito, de candeias ás avessas na política, próximos na civilidade e nas coisas da vida que realmente importam.
Mais um ano com saúde (como venho repetindo: o importante é voltar) e mais um grandioso concurso de presépios de Natal, dos quais nunca ganhei nenhum (injustamente). O Luis, como bom socialista, coloca todos os concorrentes ex aequo. Eu, que de socializante nada tenho, aprecio a livre concorrência e apresento-me todos os anos com uma fantástica peça de faiança do mais requintado recorte estético, com a fezada de que este é ano.
Aqui fica, pois, um lindo camelo (colecção particular), que vai seguindo o rasto da estrela mais brilhante, não em Belém, mas algures numa residência lisboeta onde se festeja o Natal e não o Pai Natal.
Para o Luis, o meu glorioso exemplar, no já habitual estilo conservador e tradicional (mas não ultramontano) que me caracteriza:
Para o Luis e família (este ano renovada), Festas Felizes. Desconfio que algures na sua sala, existe um presépio que há-de vir a estar, no futuro, nas salas dos que lhe são mais queridos.
segunda-feira, dezembro 12
domingo, dezembro 11
sábado, dezembro 10
O caso da madura que devia estar a estudar e está a escrever posts numa biblioteca.
A viagem estava a correr bem, comboio a horas certas, lugar de luxo junto à janela e, não fossem as carpideiras dos lugares da frente, até podia ter um bom sono (caso existam bons sonos durante as viagens).
Grande seca, as conversas lúgubres que me chegavam aos ouvidos, triste fado o nosso com tanto queixume na voz, a morte, nunca se está bem, é assim a vida, e eu sem as poder evitar.
Entretanto levanta-se uma das lideres da choradeira com a devida écharpe; muita lamúria e uma casa de banho ali ao pé, de que se queixava a criatura de Deus? Passaram cinco, dez minutos, já havia gente de bexiga apertada junto à porta, e o marido perguntava se demorava muito, ela respondia do outro lado da porta que estava quase. Por mim, tudo bem; era menos uma naquele festival de lamentações que as viagens proporcionam assim que se juntam vários portugueses desconhecidos entre si.
Mas o tempo passava, dez, quinze minutos, o marido de olhar inquieto, batem à porta e nada. Que diacho, agora isto, chama-se o cobrador que abre a porta com chave mestra e mulher nem vê-la. Desapareceu, evaporou-se, mas para onde terá ido se ninguém a viu sair? É mais que certo que devem ter levantado a tampa da sanita; nunca se sabe que mistérios podem existir no fabrico de carruagens.
Entretanto (graças a Deus) chega-se ao destino. Muita conversa entre os passageiros e eu mortinha por sair dali, temos pena, mas aquilo não é filme para mim. Da mulher, nem rasto, nem vestígios, nem sinal, o Hitchcock há muito desaparecido e o Truffaut também.
Nunca mais ouvi falar do caso. Não foi assunto de jornal nem crime de televisão, o desaparecimento da idosa em retrete de comboio, mas não admira, pois o fisco ainda lá não chega. Só hoje, uma breve notícia falava no caso de uma mulher de écharpe ter sido encontrada na casa de banho de um avião, tendo sido detida para interrogatório. Há-de ser droga ou terrorismo, dizem eles.
Imagem do filme Nightmare At 20,000 Feet