domingo, junho 26

Pontos rápidos

Eu ainda sou do tempo das costureiras: havia as que iam a casa para arranjos ou necessidades de grande porte (como cortinados), as que nos recebiam no quarto de costura em casa própria, e as mais finas, com marcação e sala de espera.
Claro que estas fadinhas da agulha tinham diversas especialidades; eram raras as que tanto faziam roupa de dormir como cortavam um fato. Seja como for, era sempre preciso esperar, e muitas vezes, era uma espera terrível para uma miúda que tinha idealizado aquela blusa e mesmo para as adultas: quem nunca foi buscar um vestido mesmo em cima da hora do casamento, que se acuse.
Havia costureiras com fartura, era um facto, mas mãos de ouro, essas eram poucas e faziam-se filas para arranjar uma aberta no apertado calendário de festas familiares, vestuário de verão, de inverno, e outras minudências, como arranjos variados. Estou a esquecer-me das senhoras da malhas, com as máquinas eléctricas de fio a peso, mas esse era o domínio das adultas, se bem que olhando para velhas fotografias bem vejo os casaquinhos saídos de novelos. Em bom rigor, nunca percebi o motivo por que umas eram "modistas" e outras "costureiras", mas ambas eram uma grande seca.  Uma maçada para meninas e adultas naqueles paraísos das damas: sobe bainha, pesponto aqui, corte acolá, endireite as costas e meia dúzia de alfinetes.
Vem isto a propósitos da novas "costureiras" dos shoppings, para arranjos rápidos e botões, muita máquina, pouco jeito, preço milionário. Têm tabelas de preços para todos os serviçose usam computadores e fazem campanhas promocionais via telemóvel. Abandonaram os vãos de escada, o biscate foi substituido por tributação fical e nós deixámos de as tratar pelo nome. Empregam chinesas, russas, ucranianas e brasileiras; portuguesas julgo que só mesmo os patrões e eu sou uma chata, bem sei, mas venho de uma casa de mãos perfeitas com chuleados perfeitos e técnica a rigor. Presto para pouco (estupidamente aprendi pouco), mas sei reconhecer alinhavos competentes, uma casa bem cosida e um botão bem pregado. É só abrir uma gaveta e ver panos de cozinha com monogramas bordados à mão.

3 Comments:

Anonymous Carlos Pires said...

Uma espécie de microsociologia da costura...

5:26 da tarde  
Blogger Fernando Martins said...

Belo post. Especialmente para mim que venho de uma família de costureiras. Mãe e duas tias começaram aos 10 anos a coser. Foram abandonando a actividade na medida das circunstâncias. Mas das três a do meio, já com mais de 70 anos, era e é a mais lenta mas, de longe, também a mais perfeita e competente. Um luxo nos dias que correm.

11:02 da manhã  
Blogger M Isabel G said...

AH! Então compreendes o que quero dizer. Não falei nos enxovais das noivas nem dos bebés, isso sim uma enorme obra de amor e cuidado. Já não há.

11:24 da manhã  

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