segunda-feira, julho 30

"Everyman", eu, tu, ele, nós, vós, eles.

"There's no remaking reality. Just take it as it comes. Hold your ground and take it as it comes."
É isto sim, mas nada disto é simples. Nada é pacífico no estoicismo destas palavras. Um consolo, talvez, mas e a raiva de aceitar a realidade tal como ela nos vai chegando? Está no livro, cruel como na vida "aguentar firme e aceitá-la como ela vem".
Porventura nunca terei lido um livro assim. Uma obra difícil de ler para quem traz a morte da alma, nem sempre com a doença, nem sempre com rosto, nem sempre com o corpo, mas sempre a morte, devastadora e solitária. "Aguentar firme e aceitá-la como ela vem": são estas as palavras que vão soando ao longo do livro. Não há aqui Vida e morte de um corpo masculino, como o título do livro que o personagem gostaria de ter escrito, mas a luta do homem comum num corpo que vai definhando "less and less as older and older, waiting for nothing".
A trajectória da morte está no peso da terra sobre o caixão no funeral do pai, na vontade de pedir que não continuasssem a bloquear as aberturas pelas quais ele sorvia a vida, nas últimas palavras com antigos colegas ("Old age isn't a battle, old age is a massacre"), no sonho do suicídio da aluna de pintura cancerosa, ou no diálogo com o coveiro. Aliás, Roth também está aqui, como no cemitério onde se encontram os seus pais: "There, I feel closer not to the dead but to their memories; the place has a significance"*
É também a morte dos amigos do autor que está na origem do livro:"If you're lucky, your grandparents will die when you're, say, in college. Mine died when I was a schoolboy. If you're lucky, your parents will live until you're somewhere in your 50's; if you're very lucky, into your 60's. You won't ever die, and your children, certainly, will never die before you. That's the deal, that's the contract. But in this contract nothing is written about your friends, so when they start dying, it's a gigantic shock."
É um livro em que a doença vai arrebatando o corpo mas não o desejo, sobre o remorso, desencontros, ambiguidades, infidelidade, amor, amizade, dor, sofrimento, solidão, em que a biografia da doença se vai confundindo com a biografia da vida, um livro simplesmente sobre a mortalidade.
Porém, não é Roth que está no livro. Pelo contrário, saiu da sua privacidade e lá está na capa, deixando-se fotografar saudável, cheio de vida e ainda com muitos livros por escrever, espero eu. Livros com capa preta ou de outra cor qualquer.

12 Comments:

Blogger PA said...

Olá,
O bom gosto que revela na maneira como escreve, extravasa também para aquilo que anda a ler!
Também acabei de ler há duas semanas o «Everyman», edição de capa verde da Vintage International, de Abril de 2007. Gostei muito do livro e acabou por ser uma experiência engraçada, porque a leitura decorreu quase sempre em transportes públicos - há que séculos que não lia um romance sem ser nas férias. Vai-me dizer, e com razão, que os transportes não são o sitio indicado para o fazer, mas era isso ou não o ler tão cedo.
Cumprimentos.
PS-Já agora, para responder a um seu comentário a um comentário meu, uma mulher bonita é sempre uma mulher bonita. Passem quantos dias, meses ou anos tiverem passado.

12:41 da manhã  
Blogger M Isabel G said...

Um blog com esse nome? Mas tem que ler em todo o lado ! :)
Obrigada pelo comentário

12:51 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Acabado de ler a noite passada. Em edição de capa vermelha (Vintage Books).

Cores de capa já são, até ver, três. O texto, o tal texto cheio de estoicismo, há-de ser o mesmo.

Inesquecível.

Costa

11:29 da manhã  
Blogger M Isabel G said...

De facto este post não é sobre a cor da capa do livro (negra como a morte ns versões inglesa e portuguesa que tenho comigo).

12:09 da tarde  
Blogger Alexandra said...

Como a compreendo, cara Isabel.
"Não houve um dia da minha vida em que não tivesse pensado na morte", terá dito Bergman ontem desaparecido.
Ela acompanha-nos passo a passo ao longo da nossa vida.
Gostei deste último livro de Roth mas continuo a preferir "O animal moribundo".

3:33 da tarde  
Blogger -pirata-vermelho- said...

Desculp! mas não estou nada de acordo com o que diz a abrir e ainda menos se dito em 'estrangeiro'...

Fala alemão?

3:34 da tarde  
Blogger -pirata-vermelho- said...

(... mesmo que o meu comentário pareça off-topic)






( 'tá a ver como é 'giro' falar amaricano?
OFF TOPIC! uma expressão sem concorrente, na prosódia, digamos)

3:36 da tarde  
Blogger -pirata-vermelho- said...

(embora tenhamos sempre, nem que seja de reserva, o bernáculo purtuênse, canudo...)

3:37 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Tanta banalidade... Continue a postar umas fotozitas e não se meta nestas andanças, por favor. Poor Roth!

10:58 da manhã  
Blogger M Isabel G said...

owerbald,

Sim, porque para comentários de grande profundidade intelectual já basta o seu. Uma sumidade. Uma luminária. Um comentário frontal, corajoso, bem fundamentado, enfim, glorioso!O melhor que a crítica literária já viu nos últimos tempos. Anónimo, claro, como só os valentões sabem ser.
Um bom dia também para si e largue o azedume ou vá para o raio que o parta que a mim tanto me faz.

11:08 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Estimada Miss Pearls :

A par da "Estrada" de Cormac McCarthy este "Todo o Mundo" de Philip Roth é um dos livros que me marcaram este ano. Li o livro em tradução Portuguesa, mas depois deste post ficou a vontade de o reler na Língua original. Sou fã incondicional de Philip Roth, um mestre a quem o inqualificável Batista Bastos reputa como sendo um escritor de 5ª categoria (vide uma das edições recentes do Ypsilon). Este ano ainda tive o prazer de ler o "Complexo de Portnoy" que o meu irmão me endossou de Lisboa. Livro escabroso mas muito divertido. Seja como for a obra prima do homem é sem dúvida a "Mancha Humana"...um livro obrigatório.
Saudações Insulares,
JNAS
(www.ilhas.blogspot.com)

11:11 da manhã  
Blogger M Isabel G said...

"Poor Roth! "

Pobre sou eu que tenho que aturar esta gente tonta!

11:12 da manhã  

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