American way
Nestes últimos dias e por diversas razões, recordei-me deste post do Luis M. Jorge. Nesta terra de apagada e vil tristeza, onde até o arroz é malandrinho, não há forma de largarem a Idade Média:
"Há uns dez anos, no final da minha primeira viagem aos Estados Unidos, cheguei a Greenwich Village suado, nauseabundo, de calças esfarrapadas e chanata de couro com dedo poeirento a despontar. Enquanto me preparavam o quarto, tive a rica ideia de visitar o quarteirão. Entrei por desfastio numa galeria de arte e pus-me a olhar para um quadro, que considerei logo uma homenagem muitíssimo escancarada. Afinal era uma reprodução que tinha levado uns toques do autor: um acabamento a tinta de ouro, ou coisa que o valha, sobre o rosto da Marilyn Monroe.
Nessa altura fui interrompido por um sujeito de falinhas mansas, arzinho chique e insinuante, que desatou a pôr a obra nos píncaros — pois tinham sido feitas apenas meia-dúzia de reproduções com o tal acabamento do mestre, o que a tornava muito recomendável e um óptimo investimento. Demorei alguns minutos até perceber que o homem me queria vender um Andy Warhol. A mim, praticamente um homeless, de roupa encardida e cheiro a bedum. O capricho, descobri a tempo, custar-me-ia doze mil contos.
Saí estonteado e entrei na Armani Exchange. Depois dos doze mil contos tudo me parecia barato, e lá acabei por comprar três ou quatro peças. A menina do balcão perguntou quem me ajudara a prová-las e eu, que tinha agido num ápice, apontei-lhe um colega que nunca vira mais gordo, pois sei que ali se ganha à percentagem. O colega veio ter comigo de olho meloso, por pura gratidão. No minuto seguinte já me convidara para um pequeno-almoço exclusivo, com clientes habituais, em que me seria revelada uma nova futilidade qualquer.
Aquilo sim, era vida! Chegara mal enjorcado a Nova Iorque, e ao fim de meia-hora já tudo me pertencia. Em vez de ser escorraçado da Zara, recebia convites da Armani. Em vez de me darem esmolas, tentavam vender-me obras de arte quase originais. Comecei a entender a conversa sobre a terra das oportunidades. (continua com Obama e Sara Pahlin)"
2 Comments:
Muita saudade tenho dos posts do Luís. Espero que tudo lhe esteja a correr de feição, nesta nova etapa da sua vida.
Antes o "malandrinho" do que essa sociedade algo só tem valor se tiver preço de mercado.
e em jeito de conclusão: brilhante primeira dinastia de Portugal!
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