quarta-feira, setembro 6

Fim de tarde (11)

Com a primeira, desconfiou assim que entrou no carro e estava um xaropada no leitor de cd's. Entre suspiros e aspecto enfastiado, percebeu-se que aquilo não anda bem. Com outra, um jantar antecedido de mais música para carpir, nenhum alcool e algum desmazelo, não augurava nada de bom. Perante situações destas, das duas uma: ou se pergunta o que se passa e irritantemente nunca se passa nada. Ou então, passa-se alguma coisa e toda a prudência é pouca para conselhos e opiniões não especializadas. Coisas de maridos, talvez, que os filhos ainda andam debaixo de olho. Ou então não, mas contavam sempre com um generoso silêncio alimentado a confiança de muitos anos. O carreiro é cómodo de descer, é fácil deixar-se ir, o embalo é suave e complacente. São mil e uma razões, por isto, por aquilo, verdades, motivos, tristezas, penas, custos, o passado, o presente, o futuro, ele, ela, os outros, e a cabeça que ganha a vida do corpo que se vai ajeitando a ceder. Naquele fim de tarde, com a janela a deixar entrar os barulhos dos outros enquanto escutava novelas com pouco enredo, percebeu sem consolo nem glória que havia carreiros que não podia descer. Precisava dizer qualquer coisa sensata para soltar aquele emaranhado de nós, mas que sabia ela destes novelos alheios? Ouviu risos nas escadas com gente alegre que se aproximava. Não era preciso mais nada.
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