domingo, novembro 13

" (...) Contudo, onde iria eu arranjar destreza para organizar cerca de oito mil caracteres em redor da excelente arquitectura verbal ouvida ao telefone [sobre um conto de Maria de Fátima Borges]? E a quem iria isso interessar, se não poderia ainda ler o que eu ouvira? Bem sei que podia pegar num livro qualquer dos muitos autores que por aí abundam, dizer uma série de parágrafos inanes onde escondesse tudo aquilo de que não gostava entre adjectivos de parágrafos repetidos de crónica pra crónica, mas não só não me sentiria bem comigo mesmo como sobretudo há esta questão: quando falamos de alguém em literatura, esse alguém fica-nos colado; tornamo-nos afins da sua existência. Desse modo, é melhor nada dizer, deixar o que escrevemos na vida sem demasiados motivos para arrependimentos ou vergonhas, que já tenho que me cheguem. Aliás, metido neste engano, deveria reter algo de Teógnis, felizmente também traduzido por Maria Helena Rocha Pereira, e pensar quanto aos consumidores de jornais podem parecer indiferentes estas preocupações: Quem poderá aguentar este espectáculo? Uns aos outros se enganam, zombando, sem conhecer a opinião dos bons nem dos maus." (...) Joaquim Manuel Magalhães : "Quebração", Revista Actual-Expresso, 7 de Outubro 2005 Quadro:RENÉ BERTHOLO -"O Lugar Indicado"
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