A cidade, brevemente
A cidade está deserta. Não me queixo. Por uns dias parece que se acalmam as buzinas, os movimentos são mais lentos, talvez até mais pacientes. A cidade não muda de povoado, mas aparecem viajantes, mochileiros e os recantos, as ruela e as praças são surpreendidas por máquinas que fotografam o que sempre nos pareceu óbvio e banal. De resto, estão por aqui, por ali, os pobres de sempre, os velhos solitários, os loucos das avenidas, os imigrantes desamparados, os bêbados em monólogos, os que ficam por cá e os que não têm terra.
Eu não desgosto da cidade assim, enquanto conto os dias para fugir dela. O que gosto mesmo é de fugir primeiro para perto e depois sair para longe, saltar do meu mundo para o mundo dos outros, sair das vistas curtas. Quando se chega trazem-se mais palavras, guardam-se encontros e trazem-se outras cores. A moldura com novos abraços na praia, na serra ou numa cidade nova ficará com glória certa na companhia de beijos antigos em praias diferentes
Acho simpática a cidade assim vazia de Segunda a Sexta. O Sábado é útil para tratar da vida, mas o Domingo totalmente inútil. A cidade despovoada parece ainda mais quente e até os bichos parece que desertam para se acomodarem nas sombras.
As pessoas saúdam-se alegremente com "Até depois da férias", como se fugissem uns dos outros por uns tempos, como se as férias fossem uma libertação não só dos lugares, mas também dos outros. Espero sempre que venham mais felizes. Por uns tempos, pelo menos.
(Texto reeditado)
1 Comments:
Texto belíssimo.
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