sexta-feira, outubro 12

"Todos perdemos muito pela partida dela. Faz-nos falta todos os dias. Tenho saudades. Mantenho na memória a última vez que a vi, depois de as levar ao colégio, em mais uma manhã atrasada, subindo a rampa da escola, a neta numa mão, na outra a lancheira. Não sei porquê, fiquei a olhar até ao fim." (J.) Ela faz-nos tanta falta. A luz clara, crua, cruel, bateu-lhe violentamente no rosto. O espelho devolvia-lhe a imagem das rugas e dos traços que tratava pelo nome. Sem esforço, reconhecia a cartografia de cada linha, seguia-lhe o norte e o sul, acompanhava-lhe a cronologia dos anos, dos meses, dos dias e o curso das horas. Nos vincos do rosto que luzes suaves amenizavam, percorria-lhe os socalcos traçados em calendários de memórias e junto aos lábios, nunca deixou de sentir o sabor a sal no trajecto dos sulcos. Os cabelos, porém, disfarçavam as marcas da saudade que o rosto não escondia. Os sinais da tristeza estavam lá todos mas ocultos pela alma, onde ninguém chega ou quer desvendar. Mas o que o espelho lhe devolvia e que a luz acentuava, era também um sorriso: estava lá tudo. Fechou a porta e saiu para uma luz mais clemente mas menos humana. Sorte a dela: também tinha herdado o coração.
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