segunda-feira, julho 10

Cheiro a fumo

Muitos amigos nossos já passaram situações dramáticas com incêndios. Tanto na zona do Pinhal, onde lutaram sózinhos contra o fogo já só para salvar a casa assim como nas aldeias da minha vida, desconfio que não encontro ninguém que não tenha ficado sem a horta ou o olival. Há dois anos, o fogo chegou-se à beira das casas, levando consigo tantos anos de trabalho para arrancar daquela terra pobre alguns feijões, abóboras ou couves. Ainda o meu pai era vivo quando numa tarde de Verão, daquelas que só os índigenas conhecem, ouvimos mais uma vez a sirene dos bombeiros. A velocidade com que ocorriam (e ocorrem) incêndios era tão grande que praticamente nos tornámos imperturbáveis com aquela barulheira proveniente mesmo do centro da cidade. Apesar desta rotina dramática dos incêndios, procurava-se saber o que estava a arder. Nunca se sabia se seria a nossa vez. Nessa tarde de canícula, tinha sido "uma maluca que tinha pregado fogo a sobreiros". Foi encontrada com facilidade e transportada para o hospital, onde por certo lhe devem ter rapidamente diagnoticada a loucura. Coisas de aldeia pequena, não foi necessário muito tempo para sabermos que daquela vez nos tinha saído a nós a rifa do fogo posto. A história termina praticamente aqui. A criatura foi dada como inimputável, as árvores tiveram que ser todas arrancadas, plantadas de novo e a natureza encarrega-se de os fazer crescer. Muito lentamente, como devem saber. Este ano ainda não sei, mas não costuma falhar. Pelo menos uma ou duas vezes por Verão, os fogos voltam à aldeia. Certinhos como a morte.
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